Tribunais elevam produção com teletrabalho e julgamentos virtuais

     

    Por Arthur Rosa, Joice Bacelo e Rafael Rosas, originalmente publicado pelo Valor.

    Desde o dia 16 de março, segundo o CNJ, foram proferidas 3,8 milhões de decisões

    O Judiciário se adaptou rapidamente ao mundo virtual em razão da pandemia de covid-19. Um total de 3,8 milhões de decisões já foram proferidas por juízes em home office - 2,3 milhões de sentenças e acórdãos desde 16 de março, além de milhares de liminares, muitas relacionadas ao coronavírus.

    O placar, atualizado diariamente pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mostra que o Judiciário não parou em nenhum momento. Pelo contrário, tribunais registraram aumento de produção.

    A pandemia gerou ainda uma outra situação inusitada. Pela primeira vez um juiz federal tomará posse como desembargador em solenidade virtual. Não havia outro caminho, o magistrado João Batista Gonçalves, de 73 anos, novo integrante do Tribunal Regional Federal (TRF) da 3ª Região, está no grupo de risco.

    A posse está marcada para as 14h de hoje. Após a cerimônia, ele permanecerá em casa, como os demais 41 desembargadores e os 387 juízes federais que atuam nos Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul (área de abrangência do TRF).

    Tribunais em todo o país montaram verdadeiras operações de guerra para mandar juízes e servidores para casa. O que contribuiu para a velocidade foi a cultura já implantada do teletrabalho e dos processos e julgamentos virtuais.

    “Foi um trabalho hercúleo, de poucos dias”, afirma o presidente do TRF da 3ª Região, desembargador Mairan Gonçalves Maia Júnior. Ele lembra que o teletrabalho e os julgamentos virtuais são feitos desde 2016. Agora, em meio à pandemia de covid-19, sessões e audiências passaram a ser realizadas também por videoconferência, o que possibilita a realização de defesas orais por advogados.

    Houve aumento de produção. O TRF, as varas federais, juizados especiais e turmas recursais registraram crescimento na média semanal de atos. Entre 9 e 15 de março, antes da obrigatoriedade do teletrabalho, foram editados quase 71 mil - entre sentenças, acórdãos, decisões interlocutórias e despachos. Já entre os dias 23 e 27 do mesmo mês, após a implementação total da modalidade, foram 83 mil atos.

    No Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), o maior do país, cerca de três mil juízes e 40 mil servidores foram mandados para casa. De lá, são os responsáveis pela maior parte das decisões produzidas no país: cerca de 1,2 milhão desde 16 de março, além de milhares de despachos.

    “Os juízes estão bastante produtivos neste momento”, diz o presidente do TJ-SP, desembargador Geraldo Francisco Pinheiro Franco. “ É um indicador de que poderemos adotar mais trabalho virtual daqui para frente.”

    No TRF da 2ª Região, que abrange os Estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo, o teletrabalho não afetou o ritmo de decisões. Entre os dias 16 de março e 19 deste mês foram proferidas 31,1 mil sentenças, um avanço de 24% na comparação com as 25.085 em igual período do ano passado.

    Renato Pessanha, presidente da Associação dos Juízes Federais do Rio de Janeiro e Espírito Santo (Ajuferjes), ressalta que atualmente no TRF quase todos os processos já estão na plataforma eletrônica, o que favorece a aplicação do trabalho remoto. “Com a chegada de uma crise repentina, [o uso da plataforma eletrônica] ajudou a manter o ritmo de trabalho”, frisa ele, que é juiz titular da 8ª Vara Federal do Rio.

    Além das sentenças, o TRF computou 84.276 decisões interlocutórias - aquelas que acontecem dentro dos processos, como liminares - entre 16 de março e 19 de abril, um crescimento de 11% ante as 75.928 de um ano antes.

    Na segunda-feira, uma nova determinação do TRF da 2ª Região, seguindo resolução do CNJ, trouxe novas regras para o trabalho remoto, que foi prorrogado para 15 de maio. Antes suspensos, os prazos dos processos eletrônicos vão voltar a correr a partir de 4 de maio. Os processos físicos continuam com os prazos suspensos.

    Diversamente do que muitos esperavam, afirma o advogado Luciano Godoy, sócio do LUC Advogados, a pandemia não paralisou a Justiça. “Pelo contrário, os tribunais e o próprio CNJ reagiram rapidamente às limitações impostas pelo isolamento social”, diz. “Os números recentes indicam um aumento da produtividade do Judiciário.”

    Muitas decisões nos tribunais estão relacionadas à pandemia de covid-19. “Há um grupo de juízes com atenção só para esses casos urgentes. Fica mais fácil, dessa forma, compartilhar decisões e seguir uma lógica de enfrentamento à crise”, diz a presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Renata Gil. “Estamos conseguindo dar respostas rápidas”.

    A magistrada cita como exemplo uma decisão da 2ª Vara de Fazenda Pública de Teresina (PI), que concedeu a alunos do curso de medicina de uma universidade do Estado o direito de antecipar a formatura para que eles conseguissem se inscrever no programa Mais Médicos, do governo federal, e, desta forma, reforçar o atendimento à saúde. “A Justiça deu a resposta antes do MEC [Ministério da Educação] vislumbrar essa necessidade e fazer a regulamentação”, diz Renata Gil.

    Partiu do Judiciário, destaca, a permissão para que um hospital em processo de falência fosse disponibilizado ao Estado. Isso ocorreu em Goiás. O juiz da 21ª Vara Cível de Goiânia, Átila Naves Amaral, considerou a necessidade de novos leitos em razão da pandemia.

    Consta no processo que o Hospital Santa Genoveva, em Goiânia, tem área construída de dez mil metros quadrados e ainda hoje - mais de três anos após o início do processo de recuperação judicial -, apesar de fechado, “encontra-se dotado de toda a estrutura”.

    Os juízes, mesmo trabalhando de casa, estão preparados para atender os advogados, segundo a AMB. Os horários podem ser agendados com a secretaria e o magistrado, em vez de recebê-los no gabinete, atende por telefone, e-mail ou videoconferência.

    Isso também ocorre com os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Como as visitas aos gabinetes estão temporariamente suspensas, os advogados conseguem acesso por meio eletrônico. Os memoriais e até as defesas orais dos processos julgados no plenário virtual são enviadas, em vídeo, por e-mail.

    Haviam sido apresentados, até ontem, 1.269 processos relacionados à covid-19 ao STF. Destes, mil já tinham decisão proferida. “Mesmo em meio à pandemia, seguimos sendo a Corte que mais julga processos no mundo”, disse o presidente da Corte, o ministro Dias Toffoli, ao abrir a primeira sessão plenária por videoconferência, realizada na quarta-feira da semana passada.

    “O aprimoramento dos julgamentos virtuais tem sido constante nesta Corte”, acrescentou durante o discurso. Segundo Toffoli, a transformação tecnológica e digital vem sendo feita por muitas gestões e, atualmente, 95% dos processos no STF estão em formato eletrônico. “Agora, como nunca antes, o virtual é o real”, afirmou.

     

     

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